sábado, 22 de dezembro de 2012

Monte Kama e as Sanguessugas

Estava programando a minha nova incursão ao Monte Fuji quando encontrei o site de um clube de montanhismo que programava uma subida, era o Suzuka Hiking Club, o clube leva esse nome não por ser fundado por membros da cidade de Suzuka, e sim pelo fato de concentrar a maior parte de suas escaladas nas montanhas de mesmo nome. Rapidamente iniciei uma conversa por e-mail com um dos lideres, porém ele esfriou os meus ânimos, alegando que aquela subida era apenas para membros e ainda questionando o meu nível de caminhada em montanha, afinal nunca havíamos nos encontrado. Repassei a ele as montanhas que já havia subido incluindo claro o Monte Fuji, e ele concordou com a minha presença desde que eu os acompanhasse em uma subida de menor escala, me programei conforme o calendário do clube e escolhi o Monte Kama, ou Kamagatake em japonês.

O líder desta subida era outra pessoa de codinome Toriya, ninguém usa o próprio nome dentro do grupo, mantive contado com ele via e-mail e ele foi super cordial fornecendo informações até marcar o local e a hora de encontro do grupo. Nesse dia seríamos 10 pessoas sendo que 5 incluindo eu fariam uma experiência, depois da terceira experiência você é convidado a entrar no clube. Ansioso fui o primeiro a chegar e aguardando cerca de 20 minutos todos estariam ali, nos reunimos sem muita cerimônia partimos pra montanha.

Chegando no local que inclusive estava muito cheio de carros, fui questionado por um dos integrantes se eu subiria com aquela roupa e se havia passado repelente, respondi que sim e percebi que além das generosas doses de repelente nas roupas e calçados apenas eu estava de bermuda com as pernas à vista, fiquei preocupado pois talvez houvesse um número excessivo de mosquitos, afinal estávamos no auge do verão.

Uma pequena caminhada até a trilha e aí sim tudo no estilo japonês, todos recebemos mapas da rota, recebemos cronograma dos horários que seriam cumpridos e todos fizeram uma breve auto apresentação. Das 10 pessoas 4 eram mulheres e pra minha surpresa uma mulher de codinome Gabi falava espanhol com uma fluência impressionante e até um pouco de português, essa seria minha salvação para os momentos de difícil entendimento.

Começamos a subida em um ritmo bem ameno e muitos queriam conversar comigo, afinal eu era o primeiro estrangeiro a subir com o grupo e isso parecia divertido pra eles. Um deles me mostrou umas minhoquinhas no chão, tentou me explicar porém eu não entendi e na primeira parada que fizemos me questionaram, você sabe o que é Hiro? Eu disse que sim, porém sem muita convicção pois essa palavra tem inúmeros significados, consultei o Sr. Google sem sucesso e na explicação deles era um bicho que picava e saia sangue, imediatamente minha cabeça relacionou Hiro com mutuca.

Eles portavam até mapas com regiões que deveriam ser evitadas pela grande quantidade de Hiro, até que em outra parada Kikori se aproximou de mim apontando pra minha perna e exclamou, Hiro!!! Era uma daquelas minhoquinhas que ao tentar tirá-la da minha perna ela grudou e inflou como uma bexiga, era uma sanguessuga que me deixou com uma bela mancha de sangue na meia. Disse a eles que esse bicho também havia no Brasil, porém dentro da água e não em terra, e Toriya até comentou ter visto na TV que haviam pessoas que faziam tratamento com sanguessugas.

Tirando o desconforto da perseguissão das sanguessugas a caminhada fluiu bem e logo saímos da mata pra encarar os rochosos últimos 100 metros do Monte Kama, esse trecho te dá diversas opções, nenhuma delas muito fácil, porém algumas muito difíceis. Muita suadeira nessa hora e algumas mulheres se queixando de exaustão, mas sem parar atingimos o cume e para minha surpresa além do grande número de montanhistas que ali se encontravam presenciei a maior nuvem de libélulas que já havia visto, simplesmente um espetáculo.

Com uma vista privilegiada foi a hora de descansar e fazer um lanche, com direito a alguns legumes crus e sem tempero nenhum e um sanduíche com um pouco de areia preparado por Gabi e Chamonix. Apesar do sol que castigava os presentes a temperatura estava agradável, ainda mais se considerarmos que naquela hora deveria estar uns 35ºC na cidade. Nesse momento foi hora de jogar conversa fora e conhecer melhor os integrantes do grupo, as conversas se concentravam em um único assunto, montanhas.

Baterias recarregadas e lá vamos nós montanha abaixo, descemos por outra rota que eu já conhecia e justamente em um local perigoso deixei uma pedra se soltar e me acertar o calcanhar mais a frente. A dor foi intensa e por um momento pensei até que não conseguiria prosseguir, me esforcei e com a caminhada a dor foi melhorando. Na descida treinei bastante o meu portunhol conversando com Gabi e fiquei bem satisfeito, porque uma coisa é bolivianos e peruanos compreenderem a nossa conversa, a outra é ver que uma japonesa que fala espanhol conseguir nos entender.

Próximo do final da trilha troquei algumas palavras com Nao, uma mulher de boa estatura e muita habilidade na montanha, ela me perguntou se eu estava cansado e espantada com a negativa perguntou sobre o Monte Fuji, disse a ela que era um pouco difícil nada de mais, ela sorriu discordando da minha resposta e questionei que ela estava acostumada aos Alpes Japoneses que possuem trilhas muito mais difíceis que o Monte Fuji, mas ela me respondeu que sempre fica cansada. Mais tarde descobri que ela estava com a responsabilidade de me observar e me avaliar para uma possível subida ao vulcão adormecido.

No final da trilha mostrei para alguns uma foto minha no topo do Monte Kama e Gabi questionou se a foto era daquele dia, disse a ela que não e Toriya confirmou a ela que essa era minha segunda escalada naquela montanha, então eles me perguntaram quando foi e informei que havia sido no mês de março, pensativo Toriya respondeu que em março ainda havia neve na montanha e eu confirmei que havia um pouco, então ele questionou se eu havia usado crampons, diante da negativa me encarou com uma cara de desaprovação e um sorriso sem dizer nada, acostumado com os japoneses pude ler as palavras que ficaram presas em sua garganta, baka ou seja idiota.

Ps: Quem estiver no eixo Aichi, Gifu, Mie e quiser participar de alguma atividade do grupo segue o link do site: http://suzuhaisecure.sakura.ne.jp/


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